27 fevereiro 2014

Relato do fotógrafo Victor Moriyama, agredido pela PM

ter, 25/02/2014 - 18:50 - Atualizado em 26/02/2014 - 07:37

Enviado por Thiago Venco
Do nota e Rodapé
 
 
Na tarde do último sábado, 22 de fevereiro de 2014, manifestantes organizaram o segundo Grande Ato contra a Copa do Mundo no Brasil, na cidade de São Paulo, que acabou sendo um dos mais violentos desde o início dos protestos iniciados em junho de 2013. No último ato, ocorrido no dia 25 de janeiro, o fotógrafo da Agência EFE Sebastião Moreira fora agredido por um policial. Outros companheiros de profissão sofreram agressões muito piores ao longo do último ano enquanto cobriam os protestos pelo país, os quais tiveram seu ápice no triste falecimento do cinegrafista da TV Bandeirantes, Santiago Andrade, atingido por um morteiro disparado por um manifestante.
 

Quando cheguei ao protesto, por volta das 17hs, senti uma energia pesada no ar e essa era a mesma sensação dos colegas de imprensa que conversei. Acho que prevíamos a violência que estava por vir.
No protesto do dia 22, que reuniu cerca de 1.000 manifestantes, as agressões físicas e morais à imprensa e aos manifestantes de forma generalizada pela Polícia Militar continuaram.
O tumulto, que acabou virando pancadaria promovida pelos dois lados, Policiais e Manifestantes, começou não sei ao certo como e por qual motivo, muito menos de qual lado se iniciou. O que presenciei foi uma rápida ação policial, que em maior número, cercou rapidamente centenas de pessoas, dentre os quais jornalistas como eu e outros colegas da imprensa. Eu, exercendo minha profissão, também fui agredido por cassetetes, mesmo mostrando meu crachá de imprensa e tentando dialogar e acalmar os ânimos.
Neste momento, diversos jornalistas foram detidos e/ou agredidos, dentre os quais: Bárbara Ferreira, O Estado de São Paulo; Paulo Toledo do portal G1; Reynaldo Turollo do jornal Folha de São Paulo; Sérgio Roxo, O Globo; a Fotógrafa Alice Martins, Vice Brasil; e, o fotógrafo Bruno Santos, do portal Terra. Em poucos minutos, fomos cercados por um número muito superior de policiais que com seus cassetetes agrediam as pessoas que pediam calma e tentavam dialogar. Os oficiais os ignoravam enquanto os manifestantes entoavam em coro a frase: “SEM VIOLÊNCIA!”.
Tive lesões nos braços e nas mãos que resultaram na quebra da minha ferramenta de trabalho, fato que me impediu de registrar as ações de abuso, coerção e violência cometidas pelos policiais.
O cerco realizado pelo Pelotão Ninja da Polícia Militar durou cerca de uma hora e muitos manifestantes, jornalistas e advogados foram retirados do local com truculência. O Governo do Estado de São Paulo adotara ontem uma nova medida para conter os manifestantes: técnicas de jiu jitsu, arte marcial que prevê imobilizações. Comigo não foi diferente, fui retirado do cerco com uma chave de pescoço, e encaminhado para a calçada com outros 200 manifestantes. Durante todo este período argumentei com os policiais que eu trabalhava para a imprensa e gostaria de comunicar isso a um oficial superior. Sem sucesso. Advogados do grupo “advogados ativistas” que prestam serviço gratuito aos manifestantes presos durante os processos foram impedidos de exercer seu trabalho e retirados do bloqueio com golpes e imobilizações da técnica jiu jitsu.
Esse cenário propicia a seguinte indagação: o que é ordem para o Estado? os policiais seguem uma filosofia imposta que impõe a violência e a brutalidade em vez do diálogo. Pela primeira vez na vida tive a sensação clara de estarmos no mesmo clima da ditadura que completa 50 anos em 2014. Tive meu trabalho impedido moral e fisicamente, além da quebra parcial do meu equipamento fotográfico e a forte sensação de que a polícia e governo do Estado ainda se orientam pela violência presente na ditadura. A triste experiência do 22 de fevereiro me remete ao sofrimento incomparável que os manifestantes e presos políticos passaram durante o período do Golpe Militar no Brasil.
A polícia que quer passar à sociedade uma postura de ordem e organização se mostrou bastante desorientada sobre como encaminhar os detidos. Após o cerco fomos levados para diversas delegacias da região central, sem a posse dos nossos pertences e, portanto, sem comunicação para denunciar e buscar ajuda ao grupo. Outros colegas da imprensa e os advogados que também foram detidos alegam que tiveram seus trabalhos impedidos, pois policiais agiram com violência contra os instrumentos de trabalho além de ameaçados verbal e fisicamente pela força do Estado. Ameaças de morte, assédio moral e físico são práticas recorrentes nos protestos e demonstram a presença totalitária do Estado. É inquietante o fato de a Polícia Militar determinar o que a imprensa deve ou não fazer e divulgar. É uma atitude que impede nosso trabalho.
Após um longo processo de averiguação e encaminhamento à delegacia, fomos liberados um a um e assinamos boletins de ocorrência não criminal, relatando nossas versões dos fatos. Mais do que isso, acredito que o papel dos colegas de imprensa seja denunciar judicialmente os abusos cometidos por policias e cabe a nós, enquanto membros organizados da imprensa, batalhar por uma sociedade mais igualitária e menos opressora.

(Jornal GGN)
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários geram responsabilidade. Portanto, não ofenda, difame ou dscrimine. Gratos pela contribuição.