30 setembro 2014

"Palmadas já era"

De: Primeira Página - 28/09/14 21h27

Divulgação

Wellington Gomes Miranda – Médico Veterinário, advogado licenciado, professor universitário e Analista Ministerial da Procuradoria Geral de Justiça do Estado do Tocantins.

No dia 27 de junho de 2014 foi publicada a Lei nº 13.010 conhecida como lei da palmada rebatizada de Lei Menino Bernardo, em homenagem a Bernardo Boldrini, morto no Rio Grande do Sul no dia 13 de maio de 2014 com uma injeção letal, os principais suspeitos do crime são o pai, a madrasta e uma assistente social, amiga da família.

A nova lei estabelece o direito da criança e dos adolescentes de serem cuidados e sem castigos físicos ou tratamentos cruel ou degradante. Os juristas, os educadores, os psicólogos e os pais divergem em suas opiniões, alguns entendem que com a lei, o Estado estaria interferindo nas famílias de forma direta e abusivas. A polêmica gira em torno da eficiência da norma jurídica.
Os contrários à lei admitem que ela não terá efetividade, pois quem fiscalizará a ocorrência de uma palmada em uma criança dentro da sua casa, e como aferir o grau da agressão.

A juíza Luziene Barbosa Lima, da 6ª Vara Criminal de Belo Horizonte é contra a lei. Numa entrevista concedida ao Jornal Hoje Em Dia ela considera inócua a lei, pois viola a liberdade de um pai educar seus filhos dentro dos princípios constitucionais. Disse ainda que “Não vejo mal algum em aplicar palmadinhas e, sobretudo o diálogo para impor limites. O que é inadmissível são agressões físicas extremas”, considerando que é comum no Brasil formular leis em momento de comoção social, sem analisar o aspecto da efetividade da norma.

Observa ainda a juíza que o Estado costuma implementar novas leis mas não implementa políticas educacionais para que a norma seja devidamente respeitada. “No caso da ‘lei da palmada’, não há programas sociais que garantam as penalidades”. Ademais “O Estado não tem que se meter nessa área. Se os pais não corrigirem seus filhos e imporem limites, as consequências serão bem piores. Mais tarde é o próprio Estado que vai assumir essa incumbência”.

Por outro lado, os argumentos favoráveis a lei são que a violência física não educa, muito pelo contrário perpetua o costume arcaico da imposição da disciplina pelo castigo físico, psicológico e moral. A lei menino Bernardo visa educar as pessoas para que resolva seus problemas por meio do diálogo e da compreensão mútua. A pedagoga Áurea Guimarães, professora da Faculdade de Educação da Unicamp, defende que punições não resolvem, pois têm um caráter muito mais exemplar, do que reflexivo:"A criança deixa de fazer algo por medo, não por compreender o certo e o errado".

Nessa mesma linha, os psicólogos do Laboratório de Estudos da Criança (Lacri), do Instituto de Psicologia da USP, apoiam a iniciativa da lei e abominam a utilização de qualquer punição física (incluindo a palmada) “ a educação deve privilegiar o diálogo com crianças e adolescentes aos invés de punições, especialmente as corporais” 

Para Maria Amélia autora do livro “Palmadas já era” assevera que "Bater num adulto é agressão, num animal é crueldade, como você pode dizer que bater numa criança é educação? Não sou contra punição, em certas situações é necessário você usar medidas de contenção. Mas, sem degradar, nem humilhar. A criança deve entender porque está sendo punida. O ser humano fala e dialoga e assim transmite valores. A palmada é o caminho do curto-circuito".

É certo que não existe uma fórmula para educar filhos, cada um tem sua personalidade, assim como cada pai tem seu modelo de educação. É comum ouvirmos alguns pais indignados com a lei falarem “isso é um absurdo, se eu sou quem sou hoje, devo as surras que apanhei de meus pais”. A cultura de bater como forma de educar está enraizada na cultura da nossa sociedade, muitos adultos foram vitimas de violência doméstica quando crianças. Agora como educadores replicam esse equívoco de comportamento para seus filhos.

Segunda a lei, a criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.

A lei define como castigo físico, a ação de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física sobre a criança ou o adolescente que resulte em sofrimento físico; ou lesão, e como tratamento cruel ou degradante a conduta ou forma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adolescente que humilhe, ou ameace gravemente; ou ridicularize.
Punições ao agressor

A lei estabelece ao agressor às seguintes medidas, que serão aplicadas ao agressor de acordo com a gravidade do caso: I- encaminhamento
a programa oficial ou comunitário de proteção à família; II - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;III - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;IV - obrigação de encaminhar a criança a tratamento especializado;V – advertência. As medidas serão aplicadas pelo Conselho Tutelar, sem prejuízo de outras providências legais.”

Segundo dados publicado na revista mapa da violência 2012, o Brasil ocupa o 4º lugar em números de homicídio de crianças e adolescente de 0 a 19 anos de idade, ficando atrás de El Salvador, Venezuela e Trinidad e Tobago. O estudo mostra ainda que no ano de 2010 Palmas passou a ocupar o 22º lugar no ranking das capitais brasileiras com maiores taxas de homicídios de criança e adolescente, a índice registrado em 2000 era de 1,6 passou para 15,4 em 2010.

Segundo o Sistema informação de Agravos de Notificação- SINAN – do Ministério da Saúde, no ano de 2011 foram registrados 39.281 atendimentos por violências no SUS de crianças e adolescente na faixa de < 1 a 19 anos de idade, ou seja, 40% dos atendimentos de violência computado pelo Sistema. O estudo revela que a nível nacional as crianças com menos de 1 ano de idade são as mais vulneráveis à violência, em segundo lugar, a faixa de adolescentes entre 15 a 19 anos de idade. No Tocantins foi registrado nesse período 940 atendimentos de violência contra crianças e adolescentes. O Disque 100 em 2013 recebeu 124.094 denúncias de agressão contra crianças. Em 2012, foram 130.033 ligações. As denúncias incluem violência, exploração de menores, abuso sexual, trabalho forçado, negligência e violência psicológica.

É certo que a violência é uma cíclica, a vitima de hoje será o pai, o marido e o filho, agressor de amanhã. Então não bata nas suas crianças, elas não irão aprender a bater no seu neto, que não irá agredir seu bisneto. Assim conseguiremos construir uma sociedade mais tolerante e
inteligente emocionalmente.

*Wellington Miranda

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários geram responsabilidade. Portanto, não ofenda, difame ou dscrimine. Gratos pela contribuição.