20 maio 2014

Correios é condenado em R$ 2 milhões por manter carteiros em condições insalubres de trabalho


De: JusBrasil

Campinas - A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos deve respeitar as garantias trabalhistas fixadas nos editais de concurso público para carteiros, especialmente aquelas que estabelecem limite máximo de quilômetros percorridos por dia e carga máxima de peso. A sentença proferida pela 6ª Vara do Trabalho de Campinas atende aos pedidos do Ministério Público do Trabalho e, além de impor obrigações para a melhoria das condições de trabalho, também estabelece o pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 2 milhões, reversível ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). A decisão é valida em todo o território nacional.

A juíza substituta Carolina Sferra Croffi proibiu a imposição, aos entregadores, de percursos diários de trabalho superiores a sete quilômetros, independente do fluxo regional de correspondências, das particularidades das mais diversas regiões deste país e das modalidades de trajetos percorridos. Os limites máximos de peso atrelados às bolsas de correspondências que devem ser observados são de 10 quilos para homens e 8 quilos para mulheres. As obrigações devem ser cumpridas 30 dias após publicação da decisão, independente do trânsito em julgado, sob pena de multa de R$ 30 mil por infração e por constatação de irregularidade em todo o território nacional, até o limite de R$ 10 milhões, com reversão ao FAT.

A ação civil pública, originária da região de Sorocaba, decorre de um inquérito conduzido pelo procurador Gustavo Rizzo Ricardo, que apontou para inconsistências nas relações de trabalho entre os Correios e a categoria dos carteiros, em decorrência de um meio ambiente de trabalho precário e sensível à ocorrência de doenças ocupacionais.

Segundo denunciado pelo sindicato que atende a categoria, os empregados da região de Sorocaba percorrem longas distâncias portando grande volume de peso. De acordo com a entidade, em média, cada carteiro caminha aproximadamente 15 quilômetros sobrecarregados com peso sobre os ombros (que supera os 12 quilos), em violação ao edital de concurso, que prevê um percurso de até 7 quilômetros por dia.

Para instruir o processo de investigação, o MPT juntou decisões judiciais de casos individuais, cuja perícia aponta para a relação do carregamento de peso por longas distâncias e doenças lombares contraídas pelos trabalhadores que ingressaram com as ações pleiteando indenização por invalidez ou afastamento compulsório.

Eis um trecho de um trabalho pericial realizado para a Justiça do Trabalho: existe um estresso (sic) físico e psicológico com consequentes lesões osteo-musculares devido ao longo percurso diário com transporte de carga [...]. Após avaliarmos clinicamente o reclamante (trabalhador) e analisarmos as documentações apresentadas pelas partes concluímos que o reclamante é portador de patologia em coluna dorso-lombar e nos membros superiores, em decorrência das atividades de carteiro.

Também foram realizadas medições com aparelho GPS para delimitar com precisão a distância efetivamente percorrida pelos carteiros. A metodologia do estudo abrangeu os trabalhadores dos quatro Centros de Distribuição Domiciliar (CDD) da região atendida pelo MPT em Sorocaba. A média alcançada foi de 17 quilômetros percorridos no dia.

Considerando que, das 08h00 às 11h30 o trabalhador faz a triagem da correspondência, efetuando a entrega entre as 12h30 e 17h00, ele possui o tempo de apenas 4 horas e trinta minutos para fazer o percurso de quase 20 quilômetros carregando grande carga sobre os ombros.

Estudo - um estudo acadêmico citado pelo procurador e também por desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho em suas decisões mostra claramente os danos que podem acontecer ao corpo humano quando submetido à carga pesada de trabalho por longos percursos.

Segundo o autor da tese de doutoramento Projeto de Processos de Trabalho: o caso da atividade do carteiro, o pesquisador Nilton Luiz Menegon, há um limite de carga e também da distância a ser percorrida para o trabalhador para que não haja o acometimento de doenças ocupacionais. Ele recomenda o limite de 11,25 quilos para cinco quilômetros percorridos, no caso dos homens, e 9 quilos para a mesma distância, no caso das mulheres. O pesquisador alerta para a redução de peso para 3,8 quilos para homens e 3 quilos para mulheres em caso de percursos de 15 quilômetros.

Dados levantados no inquérito apontam para o afastamento, em todo o país, de 9 mil funcionários dos Correios por licença-médica, além de 4,5 mil aposentados por invalidez. A empresa tem como costume exigir uma carga de trabalho incompatível com a capacidade física e mental de seus trabalhadores, o que vem acarretando uma quantidade absurda de afastamentos por problemas de saúde. Percebe-se que, para os Correios, seus funcionários são verdadeiras máquinas, que podem ser usadas até que quebrem, devido ao desgaste físico e psicológico, para que depois sejam afastados pelos mais diversos problemas de saúde. Tudo de forma consciente e deliberada, afirma Rizzo Ricardo.

Decisão o juízo da 6ª Vara do Trabalho de Campinas julgou parcialmente procedentes os pedidos apresentados pelo MPT, de forma que, além de impor o cumprimento das obrigações previstas em edital de concurso e o pagamento de indenização coletiva, ainda determinou que, em cada setor da empresa (agências de atendimento ao público e setores de distribuição interna), em todo o país, sejam afixadas duas cópias da sentença para viabilizar a fiscalização das condutas da ré, seja por seus empregados, seja pela comunidade, ou pelas autoridades competentes, também no prazo de 30 dias após a publicação da sentença, independente do trânsito em julgado, sob pena de multa de R$ 500 para cada setor não abarcado pela fixação, no limite máximo de R$ 1 milhão.

A atitude da ré representa inaceitável descumprimento a preceitos de medicina e segurança do trabalho, os quais integram o arcabouço de normas mínimas de proteção ao trabalhador. Configuram danos de índole moral que bradam por reparação, escreveu a magistrada na sentença.

Cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho de Campinas.

Processo nº 0002433-09.2012.5.15.0003

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