Ao se chegar à idade escolar
ninguém (ou poucos) pergunta ao filho se ele quer estudar (e mesmo que não
queira, vai ter que estudar), onde quer estudar, com quem quer estudar como
quer estudar e nem em que horário gostaria de fazê-lo, pois tais questões são
determinadas não pelo interesse do filho, mas por conveniência da sociedade.
Por exemplo, o horário dos pais: trabalho, acordar cedo ou não, distância da
escola, meio de transporte disponível. Em resumo: tudo é imposto ao sujeito-aprendiz,
portanto, daí se pode abstrair que um considerável prazer de aprender já foi
comprometido, pois não se pode aceitar que se goste de
fazer algo do qual não se conheça, não se deseja, e se exija esforço mental, se
dispenda tempo, bastante tempo, o qual poderia ser dedicado ao lazer (desejado
por toda criança). Assim, embora se saiba
a importância da educação (instrução). Muitos a defendem, debatem, questionam,
mas poucos e cada vez menos a desejam efetivar no espaço mais privilegiado: a
sala de aula.
Decerto é que as mudanças têm acontecido em todos os espaços da
sociedade, porém, no âmbito da escola elas acontecem muito lentamente no
universo brasileiro. Por exemplo, a tecnologia está em todos os lugares
e assegura a transferência real de informações, dados e outros itens, porém, na
sala de aula ela não se efetiva a contento. Por exemplo, nas escolas as
tecnologias são implantadas mas não continuadas, veja-se por exemplo, os
laboratórios de informática, geralmente são instalados, mas não se consegue
assegurar sua manutenção, quando há manutenção e computadores atualizados, não
se tem profissional qualificado para gerenciá-los, ou quando se tem tais não se
tem acesso à internet, antivírus, programas compatíveis e atualizados, e por aí
vai.
A questão do celular é um bom
exemplo, nas escolas estaduais tocantinenses, por exemplo, há lei que proíbe o
uso do dispositivo em sala, mas não há quem possa fiscalizar tal uso, uma vez
que o professor ou se concentra no gerenciamento da aula, do tempo, da
aprendizagem ou estará a todo momento reclamando contra o uso indevido do equipamento,
encaminhando aluno para a coordenação (que nem sempre atua adequadamente) e
interrompendo as aulas. Há quem cobre o recolhimento imediato do dispositivo do
infrator, o que é polêmico, pois se há celular na escola com discentes é porque
a família o deu ou permitiu ao filho levá-lo para a escola. E é até
deselegante, desagradável e perigoso fazer tal recolhimento impositivo, pois
pode gerar atrito e acusação de agressão ao professor/a (o que de fato já
ocorreu em escolas e até universidades brasileiras). O uso do celular poderia
até ser estimulado na escola, porém de modo adequado, instrutivo e produtivo,
até por que a utilização do mesmo assegura acesso à informação mais rápido e de
modo mais atualizado do que a escola promove, seja por meio de seus
laboratórios de informáticas desatualizados, ineficazes e limitados, seja
através dos acervos das bibliotecas, caros, desatualizados e nem sempre
organizados, não pela competência dos profissionais que nelas trabalham, até
porque não há (em geral) bibliotecários nelas, mas professores(as) ou
funcionários(as) administrativos que para elas são designados(as), sem cursos
de capacitação necessários.
Por outro lado, é interessante
considerar que a climatização da escola é fato agradável, no entanto, a sala de
aula, à qual se deveriam dar todas as condições, não tem (pelo menos nas
escolas em que trabalha o autor – Escolas públicas do Tocantins e Maranhão).
Assim, o professor tem que ministrar sua jornada de trabalho rigorosamente, se
chegar um pouco mais tarde ou sair um pouco mais cedo, a bagunça (em geral) é
generalizada; enquanto tal não ocorre em outros setores, em que a visualização
da falta é quase imperceptível. Não se está aqui defendo o merecimento da
falta, mas o tratamento diferenciado que se promove na escola e até fora da
mesma. Em que o professor é quase criminalizado pela indisciplina, se ela
ocorre (não tem domínio de turma); e muitas vezes é criticado por ser rigoroso
(é ditador, inflexível, mandão).
Por estas e outras questões, o fato é que, a bastante tempo, muito
pouco se sonha, deseja e quer exercer a profissão de professor (faça-se a
pergunta aos jovens). Sonha-se em ser advogado, médico, psicólogo,
engenheiro, policial, bombeiro, ator, jogador de futebol, político (que nem
precisa de formação superior – apenas ser alfabetizado), mas ser professor, há
muito tempo deixou de ser objeto de desejo na sociedade que se propala conhecer
o valor da educação. O autor, por exemplo, não se arrepende da profissão que
exerce, a qual ama, estudou e estuda todos os dias para o bom exercício
profissional, mas confessa que abomina as condições e tratamentos que são
dispensados aos docentes. E, pelos tratamentos dispensados à categoria, sempre
compara o trabalho do professor ao do técnico de futebol. Arriscado. Se o time
ganha, todos são bons. Se o time perde, não há choro nem vela, o técnico é que
é ruim. E em geral, é demitido. Com o professor acontece algo semelhante. Se a
turma aprende, se desenvolve, cresce intelectualmente, é porque a escola é boa,
mas se a reprovação passa dos 50% a culpa é do professor que não sabe ensinar. Então,
o crítico índice vai para sua avaliação de desempenho, aparece nas metas da
escola, nas disciplinas críticas, a família questiona ao professor por que o aluno
tirou nota baixa, tem faltas, não gosta do professor, mas ninguém se questiona
(ou poucos o fazem) quais as condições que o professor tem para realizar um bom
trabalho; ninguém se questiona (ou poucos) se está acompanhando o filho
adequadamente, se ele está se comprometendo, se está faltando (e por que); ou
se está realizando bem o seu papel de estudante e não apenas o de aluno (estar
matriculado).
Outro fato curioso é que a formação do professor deveria ser a
prioridade de toda e qualquer instituição de ensino, mas o que se vê é uma
certa criminalização do professor quando deseja participar de cursos que
realmente contribuem para seu crescimento profissional, tais como mestrado e
doutorado. Há docente que
foi denunciado por tomar a iniciativa de se qualificar fora dos padrões
estabelecidos. Ou seja, primeiro, solicitou licença para estudos, após muito
tempo a tal licença não foi aprovada, o que gerou a necessidade de deixar
substituta (qualificada, formação exigida, as aulas foram consideradas pela
Seduc, a turma teve bom rendimento e elogios ao final do ano), e mesmo assim, o
docente teve que responder administrativamente, pois a substituição por pessoa
não autorizada é irregular; há professor, que cursa mestrado, que não tem
sequer a sensibilização da escola e nem dos demais órgãos educativos quanto ao
retorno que dará aos seus alunos após a formação. O mais importante é cumprir o
horário, independente das condições. Por outro lado, há professores e
funcionários, de escolas e de outros órgãos, à disposição de prefeituras,
secretarias e de parlamentares, indefinidamente dispensados (à disposição), sem
qualquer questionamento. Administrativamente está correto, mas moralmente, qual
a justificativa? Dos fatos se conclui que professor qualificado demais se torna
crítico demais e caro demais para a realidade brasileira. Os professores querem
se qualificar, se aperfeiçoar, serem reconhecidos e valorizados. Quem não quer?
Mas não querem as formações frágeis, superficiais, alienantes e enganosas
promovidas nas escolas ou nas diretorias regionais de ensino; as quais se
resumem, em geral, a debater textos “didáticos” que são usados na sala de aula.
O professor tem que estudar com material em nível de professor, não
de discentes. O professor tem que estudar é com professor qualificado,
gabaritado, como os profissionais da Cesgranrio, os quais promoveram cursos de
especialização para educadores no Tocantins, mas infelizmente muitos não
tiveram seus cursos concluídos, pois o estado do Tocantins descumpriu o
contrato com a instituição e muitos professores ficaram impossibilitados
terminar a formação. Outra formação digna do nome foi a do Tocantins English
Project – curso de proficiência para docentes de língua inglesa – porém tal não
teve repetição, pois é muito caro, e também por outros motivos não evidenciados.
Formação online não resolve o problema, pois as demandas do professor
são reais. O aluno é real, as deficiências de aprendizagem são reais, a
jornada de trabalho é real e a cobrança também, então como pode uma formação
online contribuir à formação docente? A teoria é eficaz e linda, mas apenas na
teoria, pois a prática é, em geral, imprevisível, incontrolável e não há replay
(retorno). Deve-se dar condições reais de atuação ao docente, inclusive
orientação psicológica e médica. Uma vez que não são poucos os professores doentes,
com inúmeras doenças não só físicas, mas principalmente psicológicas (tais como
estresse, depressão, ansiedade, neuroses, etc.), consequentes das funções que
desempenham, mas muitos acham que é preguiça, moleza, irresponsabilidade,
porém, quando se questiona se tais acusadores querem ir para a sala de aula, aí
a briga é feia. Muitos fogem da sala de aula “como o diabo da cruz”. Então,
comprova-se que a sala de aula não é fácil de administrar, entretanto tais
condições nem sempre são percebidas quando não se está nela.
Outro aspecto que remete à desvalorização ou irresponsabilização do
professor, ao ver do autor, é a redução de carga horária aos/às servidores/as
públicos estaduais do Tocantins (Decreto 4.658/2012), tal decreto não
vale para as escolas estaduais, nas atividades docentes, porém vale (na
prática) para outras funções educativas na escola, enquanto ao professor tal “benefício”
não pode ser estendido (a não ser por questões de saúde, ou outros
justificáveis, mediante processo administrativo), o qual inclusive tem que
cumprir hora-atividade na escola, sob pena de falta e posterior punição (não
progressão funcional).
Portanto, se defende aqui que o
professor não é irresponsável, mas sobrecarregado, sem as condições adequadas,
desvalorizado e, consequentemente, desmotivado.
A remuneração é tema por demais debatido. Todos sabem que professor
não ganha bem em relação à formação acadêmica e às condições de trabalho que
tem, às funções que exerce e à jornada que precisa cumprir (mas já foi pior,
muito pior). Professor que não trabalha pelo menos 03 (três) turnos de
trabalho não consegue ter uma moradia digna, transporte necessário, acesso à
informação e à cultura e, muito menos, tratamento médico, pois embora pague por
plano de saúde (Plansaúde frequentemente está suspenso o atendimento – mas o
pagamento nunca), nem sempre quando se precisa do atendimento o plano cobre
todas as despesas (há a comparticipação – pagamento proporcional a alguns
procedimentos feitos pelos). Mas alguém pode alegar que existe o Sistema Único
de Saúde (SUS). Sim, existe, mas não funciona a contento, quem já se tratou ou
teve parente atendido, diga se ficou satisfeito. Atualmente, muitos planos, não
se diferenciam muito do SUS, o que é inexplicável.
Por tudo exposto, pode-se encontrar quem discorde das opiniões aqui
expostas, quem o fizer tem todo o direito, mas com certeza não é professor/a,
não quer sê-lo/a e não quer e nem sonha em ter um filho professor.
Francisco Monteiro
Professor
(Membro da Associação de Apoio à Escola Estadual Bela Vista
Pov. Bela Vista-São Miguel do Tocantins, 01 de junho de 2013)
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