06 junho 2013

A IRRESPONSABILIZAÇÃO DO PROFESSOR


 Muito se critica o professor quando o aluno não aprende, não tem sucesso, não quer ir para a escola ou não gosta da disciplina. Porém, se deve considerar que a aprendizagem só se efetiva quando o sujeito que aprende o quer, e esta questão nem sempre é debatida plenamente, como se o desejo de aprender fosse inato, espontâneo, natural. Estas e outras questões merecem análise. Então vamos às reflexões.
Ao se chegar à idade escolar ninguém (ou poucos) pergunta ao filho se ele quer estudar (e mesmo que não queira, vai ter que estudar), onde quer estudar, com quem quer estudar como quer estudar e nem em que horário gostaria de fazê-lo, pois tais questões são determinadas não pelo interesse do filho, mas por conveniência da sociedade. Por exemplo, o horário dos pais: trabalho, acordar cedo ou não, distância da escola, meio de transporte disponível. Em resumo: tudo é imposto ao sujeito-aprendiz, portanto, daí se pode abstrair que um considerável prazer de aprender já foi comprometido, pois não se pode aceitar que se goste de fazer algo do qual não se conheça, não se deseja, e se exija esforço mental, se dispenda tempo, bastante tempo, o qual poderia ser dedicado ao lazer (desejado por toda criança). Assim, embora se saiba a importância da educação (instrução). Muitos a defendem, debatem, questionam, mas poucos e cada vez menos a desejam efetivar no espaço mais privilegiado: a sala de aula.
Decerto é que as mudanças têm acontecido em todos os espaços da sociedade, porém, no âmbito da escola elas acontecem muito lentamente no universo brasileiro. Por exemplo, a tecnologia está em todos os lugares e assegura a transferência real de informações, dados e outros itens, porém, na sala de aula ela não se efetiva a contento. Por exemplo, nas escolas as tecnologias são implantadas mas não continuadas, veja-se por exemplo, os laboratórios de informática, geralmente são instalados, mas não se consegue assegurar sua manutenção, quando há manutenção e computadores atualizados, não se tem profissional qualificado para gerenciá-los, ou quando se tem tais não se tem acesso à internet, antivírus, programas compatíveis e atualizados, e por aí vai.
A questão do celular é um bom exemplo, nas escolas estaduais tocantinenses, por exemplo, há lei que proíbe o uso do dispositivo em sala, mas não há quem possa fiscalizar tal uso, uma vez que o professor ou se concentra no gerenciamento da aula, do tempo, da aprendizagem ou estará a todo momento reclamando contra o uso indevido do equipamento, encaminhando aluno para a coordenação (que nem sempre atua adequadamente) e interrompendo as aulas. Há quem cobre o recolhimento imediato do dispositivo do infrator, o que é polêmico, pois se há celular na escola com discentes é porque a família o deu ou permitiu ao filho levá-lo para a escola. E é até deselegante, desagradável e perigoso fazer tal recolhimento impositivo, pois pode gerar atrito e acusação de agressão ao professor/a (o que de fato já ocorreu em escolas e até universidades brasileiras). O uso do celular poderia até ser estimulado na escola, porém de modo adequado, instrutivo e produtivo, até por que a utilização do mesmo assegura acesso à informação mais rápido e de modo mais atualizado do que a escola promove, seja por meio de seus laboratórios de informáticas desatualizados, ineficazes e limitados, seja através dos acervos das bibliotecas, caros, desatualizados e nem sempre organizados, não pela competência dos profissionais que nelas trabalham, até porque não há (em geral) bibliotecários nelas, mas professores(as) ou funcionários(as) administrativos que para elas são designados(as), sem cursos de capacitação necessários.
Por outro lado, é interessante considerar que a climatização da escola é fato agradável, no entanto, a sala de aula, à qual se deveriam dar todas as condições, não tem (pelo menos nas escolas em que trabalha o autor – Escolas públicas do Tocantins e Maranhão). Assim, o professor tem que ministrar sua jornada de trabalho rigorosamente, se chegar um pouco mais tarde ou sair um pouco mais cedo, a bagunça (em geral) é generalizada; enquanto tal não ocorre em outros setores, em que a visualização da falta é quase imperceptível. Não se está aqui defendo o merecimento da falta, mas o tratamento diferenciado que se promove na escola e até fora da mesma. Em que o professor é quase criminalizado pela indisciplina, se ela ocorre (não tem domínio de turma); e muitas vezes é criticado por ser rigoroso (é ditador, inflexível, mandão).
Por estas e outras questões, o fato é que, a bastante tempo, muito pouco se sonha, deseja e quer exercer a profissão de professor (faça-se a pergunta aos jovens). Sonha-se em ser advogado, médico, psicólogo, engenheiro, policial, bombeiro, ator, jogador de futebol, político (que nem precisa de formação superior – apenas ser alfabetizado), mas ser professor, há muito tempo deixou de ser objeto de desejo na sociedade que se propala conhecer o valor da educação. O autor, por exemplo, não se arrepende da profissão que exerce, a qual ama, estudou e estuda todos os dias para o bom exercício profissional, mas confessa que abomina as condições e tratamentos que são dispensados aos docentes. E, pelos tratamentos dispensados à categoria, sempre compara o trabalho do professor ao do técnico de futebol. Arriscado. Se o time ganha, todos são bons. Se o time perde, não há choro nem vela, o técnico é que é ruim. E em geral, é demitido. Com o professor acontece algo semelhante. Se a turma aprende, se desenvolve, cresce intelectualmente, é porque a escola é boa, mas se a reprovação passa dos 50% a culpa é do professor que não sabe ensinar. Então, o crítico índice vai para sua avaliação de desempenho, aparece nas metas da escola, nas disciplinas críticas, a família questiona ao professor por que o aluno tirou nota baixa, tem faltas, não gosta do professor, mas ninguém se questiona (ou poucos o fazem) quais as condições que o professor tem para realizar um bom trabalho; ninguém se questiona (ou poucos) se está acompanhando o filho adequadamente, se ele está se comprometendo, se está faltando (e por que); ou se está realizando bem o seu papel de estudante e não apenas o de aluno (estar matriculado).
Outro fato curioso é que a formação do professor deveria ser a prioridade de toda e qualquer instituição de ensino, mas o que se vê é uma certa criminalização do professor quando deseja participar de cursos que realmente contribuem para seu crescimento profissional, tais como mestrado e doutorado. docente que foi denunciado por tomar a iniciativa de se qualificar fora dos padrões estabelecidos. Ou seja, primeiro, solicitou licença para estudos, após muito tempo a tal licença não foi aprovada, o que gerou a necessidade de deixar substituta (qualificada, formação exigida, as aulas foram consideradas pela Seduc, a turma teve bom rendimento e elogios ao final do ano), e mesmo assim, o docente teve que responder administrativamente, pois a substituição por pessoa não autorizada é irregular; há professor, que cursa mestrado, que não tem sequer a sensibilização da escola e nem dos demais órgãos educativos quanto ao retorno que dará aos seus alunos após a formação. O mais importante é cumprir o horário, independente das condições. Por outro lado, há professores e funcionários, de escolas e de outros órgãos, à disposição de prefeituras, secretarias e de parlamentares, indefinidamente dispensados (à disposição), sem qualquer questionamento. Administrativamente está correto, mas moralmente, qual a justificativa? Dos fatos se conclui que professor qualificado demais se torna crítico demais e caro demais para a realidade brasileira. Os professores querem se qualificar, se aperfeiçoar, serem reconhecidos e valorizados. Quem não quer? Mas não querem as formações frágeis, superficiais, alienantes e enganosas promovidas nas escolas ou nas diretorias regionais de ensino; as quais se resumem, em geral, a debater textos “didáticos” que são usados na sala de aula.
O professor tem que estudar com material em nível de professor, não de discentes. O professor tem que estudar é com professor qualificado, gabaritado, como os profissionais da Cesgranrio, os quais promoveram cursos de especialização para educadores no Tocantins, mas infelizmente muitos não tiveram seus cursos concluídos, pois o estado do Tocantins descumpriu o contrato com a instituição e muitos professores ficaram impossibilitados terminar a formação. Outra formação digna do nome foi a do Tocantins English Project – curso de proficiência para docentes de língua inglesa – porém tal não teve repetição, pois é muito caro, e também por outros motivos não evidenciados.
Formação online não resolve o problema, pois as demandas do professor são reais. O aluno é real, as deficiências de aprendizagem são reais, a jornada de trabalho é real e a cobrança também, então como pode uma formação online contribuir à formação docente? A teoria é eficaz e linda, mas apenas na teoria, pois a prática é, em geral, imprevisível, incontrolável e não há replay (retorno). Deve-se dar condições reais de atuação ao docente, inclusive orientação psicológica e médica. Uma vez que não são poucos os professores doentes, com inúmeras doenças não só físicas, mas principalmente psicológicas (tais como estresse, depressão, ansiedade, neuroses, etc.), consequentes das funções que desempenham, mas muitos acham que é preguiça, moleza, irresponsabilidade, porém, quando se questiona se tais acusadores querem ir para a sala de aula, aí a briga é feia. Muitos fogem da sala de aula “como o diabo da cruz”. Então, comprova-se que a sala de aula não é fácil de administrar, entretanto tais condições nem sempre são percebidas quando não se está nela.
Outro aspecto que remete à desvalorização ou irresponsabilização do professor, ao ver do autor, é a redução de carga horária aos/às servidores/as públicos estaduais do Tocantins (Decreto 4.658/2012), tal decreto não vale para as escolas estaduais, nas atividades docentes, porém vale (na prática) para outras funções educativas na escola, enquanto ao professor tal “benefício” não pode ser estendido (a não ser por questões de saúde, ou outros justificáveis, mediante processo administrativo), o qual inclusive tem que cumprir hora-atividade na escola, sob pena de falta e posterior punição (não progressão funcional).
Portanto, se defende aqui que o professor não é irresponsável, mas sobrecarregado, sem as condições adequadas, desvalorizado e, consequentemente, desmotivado.
A remuneração é tema por demais debatido. Todos sabem que professor não ganha bem em relação à formação acadêmica e às condições de trabalho que tem, às funções que exerce e à jornada que precisa cumprir (mas já foi pior, muito pior). Professor que não trabalha pelo menos 03 (três) turnos de trabalho não consegue ter uma moradia digna, transporte necessário, acesso à informação e à cultura e, muito menos, tratamento médico, pois embora pague por plano de saúde (Plansaúde frequentemente está suspenso o atendimento – mas o pagamento nunca), nem sempre quando se precisa do atendimento o plano cobre todas as despesas (há a comparticipação – pagamento proporcional a alguns procedimentos feitos pelos). Mas alguém pode alegar que existe o Sistema Único de Saúde (SUS). Sim, existe, mas não funciona a contento, quem já se tratou ou teve parente atendido, diga se ficou satisfeito. Atualmente, muitos planos, não se diferenciam muito do SUS, o que é inexplicável.
Por tudo exposto, pode-se encontrar quem discorde das opiniões aqui expostas, quem o fizer tem todo o direito, mas com certeza não é professor/a, não quer sê-lo/a e não quer e nem sonha em ter um filho professor.

Francisco Monteiro
Professor
(Membro da Associação de Apoio à Escola Estadual Bela Vista

Pov. Bela Vista-São Miguel do Tocantins, 01 de junho de 2013)

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