Tocantins
Em 25 de novembro de 2015 - De Folha do Bico (Reprodução)
Antônio: “Não tenho condições de doar nada”
A pessoa está em casa. Batem à porta e quem está do lado de fora, chamando, é um oficial de justiça que traz consigo um mandado de intimação. O cidadão, convocado no documento a apresentar defesa no prazo máximo de cinco dias, lê no calhamaço alguns artigos extraídos de leis que ele pouco tem afinidade. O servidor do poder Judiciário vai embora e o notificado, já com mais atenção, lê novamente o documento e identifica tratar-se de uma convocação para que explique uma doação de campanha que fez em 2014 e que, hoje, está sob suspeita de alguma irregularidade. A tensão ao receber o documento se agrava por um detalhe: a pessoa não reconhece que tenha feito qualquer doação no pleito do ano passado e diz não saber como o seu nome foi parar na lista de doadores.
A narrativa pode parecer isolada, mas não é. Salvo alguns detalhes, é o que tem acontecido no Tocantins. De acordo com informações do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Tocantins, a Justiça Eleitoral notificou, até o momento, cerca de 610 pessoas, entre físicas e jurídicas, para que esclareçam algum indício de irregularidade encontrado em doações de campanha. E os relatos de pessoas argumentando que não fizeram doação, apesar de seus nomes estarem entre doadores, estão surgindo nessa fase de esclarecimentos. Os processos correm em segredo de Justiça.
Keila: “Notificações são só pedido de esclarecimento”
A reportagem ouviu três pessoas que afirmam que não fizeram qualquer doação. Uma delas é o pintor Antônio Moreira Glória, de Palmas. “Eu não tenho condição de doar nada”, disse em entrevista. A doação, segundo ele, é de R$ 2,1 mil, valor semelhante ao que ele ganha em meses considerados bons de trabalho.
Antônio procurou a reportagem na última semana, um dia depois de receber a notificação. “Eles (Justiça Eleitoral) perguntaram pra mim se eu tinha feito doação pra alguém, algum político. Eu falei que não tinha feito. Ele (servidor do cartório eleitoral de Palmas) falou assim: ‘E como alguém conseguiu o seu CPF, então?’. Eu falei: ó, eu não sei. Eu trabalhei com político na campanha passada e ele teve acesso aos meus documentos que a gente ia fazer uma procuração de trabalho com ele. (…)”, disse Antônio.
Produtor rural
Outra pessoa também prestou serviço na campanha a um candidato, disse ter fornecido dados pessoais para a realização de um contrato de serviço, está com o nome na lista de doadores e afirma que não doou qualquer quantia. É o produtor rural Anildo Braz Portilho. Ele também procurou a reportagem tão logo recebeu a notificação.
Anildo contou que chegou a trabalhar um mês para um candidato a deputado federal, mas não teria recebido e, então, deixou a campanha. Sobre a doação de R$ 1.433,33, Anildo garantiu que não deu nenhum recurso para qualquer político. Ele conta que o filho chegou a procurar a equipe de campanha do candidato para quem trabalhou para saber se ela tinha alguma informação. A intimação, no caso dele e dos demais, não traz o nome do candidato. “Estou muito revoltado com a Justiça Eleitoral pela maneira como ela está agindo. E não é só comigo, mas com várias outras pessoas, também pobres. Não temos dinheiro para doar para um familiar, imagina para um candidato”, considerou.
A reportagem também ouviu uma terceira pessoa, que pediu para não ser identificada, a fim de evitar outros problemas. Ela garante que alugou seu veículo para uma coligação no valor de R$ 3 mil. O dinheiro foi recebido, mas o nome dela consta entre os doadores no mesmo valor do aluguel. A pessoa disse não ter feito a doação e já apresentou defesa.
A Justiça Eleitoral ainda não decidiu sobre os casos das pessoas ouvidas pela reportagem, nem dos candidatos em que os nomes delas aparecem entre os doadores.
As doações eleitorais seguem regras específicas. Para as eleições do próximo ano, as normas ainda estão sendo definidas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Doações suspeitas
A Justiça Eleitoral argumentou, por meio da assessoria de comunicação do TRE-TO, que ainda não poderia falar sobre os casos porque eles ainda estão sob análise na primeira instância. A coordenadora de Controle Interno e Auditoria do tribunal, Keila Maria Luz Tanganeli, falou de forma geral sobre doações e explicou que a Justiça Eleitoral passa para a Receita Federal a lista de doadores e os valores doados, tanto de pessoa física, quanto jurídica. “O órgão cruzará o valor doado com a renda declarada em 2013 e calculará o percentual doado, que não pode passar 10% dos rendimentos do ano anterior para as pessoas físicas e 2%, para as jurídicas”, disse.
Keila disse ainda que a Receita apresenta uma relação com os nomes dos doadores que teriam ultrapassado os limites legais de doação e o Ministério Público Eleitoral ou a própria Justiça Eleitoral abrem uma representação. São esses casos que estão sendo notificados. “Mas isso não é a condenação do doador, pelo contrário, é um pedido de esclarecimento”, destacou. (Jornal do Tocantins)
Anildo com o título e preocupado: “Não sou doador”
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