Publicado por Lúcio Flávio Pinto ⋅ 21 de julho de 2015 - https://lucioflaviopinto. wordpress.com
Para mim, o melhor cargo que um jornalista pode querer é o de
repórter especial. Especial porque não tem horário nem conveniências. A
qualquer momento pode ser acionado e enviado (aí vira enviado especial)
para qualquer parte do mundo, tratando-se de uma publicação
internacional ou nacional, ou do Estado, num órgão local.
Esse jornalista (pau-para-toda-obra) tem experiência, conhecimento,
vivência, maturidade e qualidades outras suficientes para desempenhar
qualquer missão e realizar o que dele se espera. É o jornalista da linha
de frente, em contato permanente com os fatos mais relevantes do dia a
dia, que constituirão a história logo depois.
Há poucos repórteres especiais na imprensa paraense. Alguns têm
apenas o título e nada mais. Uns poucos merecem o qualificativo. Carlos
Mendes é um deles. Até hoje, ele integrava o diminuto quadro de
repórteres especiais do Diário do Pará. Foi chamado na semana
passada ao setor de recursos humanos do jornal, onde, hoje pela manhã,
fez o exame demissional. No dia 27, à tarde, a rescisão contratual será
homologada no sindicato dos jornalistas.
Demitir é um direito da empresa. Infelizmente, as demissões acontecem
sempre, agora com muito maior constância. São tempos de difícil
transição para o jornalismo, a cobrar seu preço em cabeças humanas. A
demissão de Carlos Mendes foi executada de forma tão súbita e sumária
que surpreende e assusta. Enoja e enjoa.
Parece que a empresa quis puni-lo, como se pudesse tal coisa. Seu
principal executivo, Jader Barbalho Filho, deu um jeito de não receber
Mendes, mesmo provocado a um encontro. Certamente não pensou em ter o
gesto de cavalheirismo e de justiça de dar pessoalmente as despedidas ao
profissional que contratou – também em pessoa – para fazer parte do
grupo reduzido de repórteres especiais do seu jornal. E que, até robusta
prova em contrário. honrou o convite, tantas foram as matérias
assinadas por ele que o Diário publicou, invariavelmente com destaque.
O próprio Mendes, reconstituindo o insólito diálogo que teve – apenas
pela internet – com o novo diretor de redação do jornal da família
Barbalho, o pernambucano Klester Cavalcanti, atribui a sua demissão
cirúrgica a dois fatos: não compareceu a uma reunião convocada pelo
chefe (plenipotenciário?) e esse chefe considerou mal apurada uma
matéria do subordinado. Não o quer no quadro de jornalistas que agora
comanda.
Qual a autoridade técnica de Klester para julgar uma matéria de Mendes? Claro, o diretor de redação do Diário é nome nacional, tem livros publicados, trabalhou em Veja (mas também no extremo oposto, a revista de fofocas Contigo),
foi enviado especial e tudo mais. Ainda assim, para o Pará e para a
Amazônia, sua folha de serviços está muito aquém do currículo de Mendes.
O mínimo de atenção que o chefe devia conceder ao chefiado seria
discutir seus pontos de vista em cima do texto. Se demonstrasse seu
veredito, o chefe podia dar mais uma oportunidade ao chefiado de
melhorar o seu trabalho. O comportamento mercurial de Klester sugere que
se tratou de um ajuste de contas – de uma punição. Por quê?
Ninguém sabe. Talvez só o chefe e o seu chefe, que se quedaram mudos e
indiferentes à cobrança da opinião pública, reconhecida pelas
contribuições e o acervo acumulado de informações produzidas em favor da
coletividade por Carlos Mendes.
Escrevo isso não por ser amigo dele. Distingo o amigo do
profissional. Já discordamos algumas vezes, mas isso é secundário. O
importante é o valor do material jornalístico que ele produziu durante
pelo menos quatro décadas de jornalismo de front. Esse passado impõe respeito, exige respeito.
O que me decepciona e entristece é ver executivos pelos quais tenho
(ou tinha?) apreço, como Jader Filho e Camilo Centeno, se comportarem de
forma discrepante com o que me costumei a observar neles e se
reinventarem, como se diz. Talvez por osmose com o que é regressivo, um
retrocesso nas boas práticas profissionais, humanas e civilizadas do que
foi a boa imprensa paraense.
Pode parecer incrível, mas novamente o jornal do senador Jader
Barbalho, que o fundou em 1982 para tê-lo na campanha para o governo do
Estado, em 1982, da qual saiu vitorioso, regride no caminho da tão
esperada profissionalização.
Link original da postagem: https://lucioflaviopinto.wordpress.com/2015/07/21/que-jornalismo-e-esse-companheiro/
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